Tecnicidade originária, animanidade e usos do corpo
Resumo
Fundamental para entendermos o horizonte generalizadamente “antropofágico” das relações interindividuais, de consumo indiscriminado de tudo e todos por todos, a ideia de “uso dos corpos” mostra ser crucial para a regulação humanista contra o abuso, a instrumentalização e a exploração. Por sua vez, o adquirido da tecnicidade originária, enquanto condição técnica do próprio anthropos, significa que nem corpo, nem linguagem escapam à disponibilidade de todas as coisas na direção indicada pela técnica. Surgindo doravante como grelha de inteligibilidade do mundo e do próprio homem, ela abre a uma teoria crítica pós-humanista da conceção instrumental, protésica da serviçalidade essencial da técnica, ao mesmo tempo que põe em causa que corpo, pertença a um género, desejo ou sexualidade possam ser o locus de resistência às relações de poder-saber tecnicamente mediadas. A animanidade sobre a qual estas operam na era da biopolítica engloba a totalidade sem resto da matéria-prima corpórea a todos os seus níveis, vegetativo, animal, de relação, e projeta-se nas políticas chamadas pós-emancipatórias em que o que está em causa não é já a definição e o exercício de direitos, liberdades e garantias da política iluminista clássica, mas a persecução experimental de modos de vida, de que é exemplo a contrasexualidade tecnoperformativa. A experimental life tecnofílica que funciona no plano da liberdade morfológica, tem, no entanto, implicações políticas decisivas.
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