Chamada de trabalhos | RCL nº. 61 |Somos sempre a vida póstuma dos outros: mapa para uma pró-memória

2024-04-02

Chamada de trabalhos | RCL nº. 61 | Somos sempre a vida póstuma dos outros: mapa para uma pró-memória

Editoras:

Inês Sapeta Dias - Universidade Nova de Lisboa, Instituto de História Contemporânea, Portugal isapeta@hotmail.com

Catarina Laranjeiro - Universidade Nova de Lisboa, Instituto de História Contemporânea, Portugal  claranjeiro@fcsh.unl.pt 

 

Somos sempre a vida póstuma dos outros: a cada instante, partes de nós metamorfoseiam-se na vida de outros, exactamente como o fazem as nossas palavras; as imagens despegam-se dos nossos corpos e tornam-se recordações de outros espíritos.

Emanuele Coccia in “Ser o mundo”

É definidora e íntima a relação que liga imagem e memória. Através do conceito de screen memories, Freud (1963) descreve a memória como uma imagem que se constitui no momento em que a recordação é ativada. Dubois (1992) encontra na imagem fotográfica o equivalente tecnológico moderno para a memória (enquanto atividade psíquica). E Halbwachs (1993) descreve a memória como reconstrução seletiva de imagens do passado impulsionada pelas exigências de coerência histórica do presente.

Este número da revista propõe explorar a multidireccionalidade da memória (Rothberg, 2009) enquanto processo materializado na gestão e transformação das ligações entre imagens. Em concreto, propomos mapear metodologias e práticas que, no campo das artes e da investigação, problematizam a definição da memória como mediação do passado. Mais especificamente, referimo-nos a metodologias e práticas que lidam com imagens separadas (ou “despegadas”) das suas origens – seja porque estão desligadas daqueles que as produziram; seja porque aqueles que as manuseiam não têm qualquer ligação com os espaços ou os acontecimentos que elas representam; seja, finalmente, porque em si mesmas são imagens que retratam aquilo que os seus produtores não têm como lembrar.

A partir da íntima relação entre imagem e memória, este dossier propõe-se explorar e mapear o campo teórico que está além dessa relação: aquele que é constituído pela intersecção entre memória e imaginação.

Esta proposta é instigada pela procura de novas conceptualizações para descrever o que, provisoriamente, arriscamos chamar de “pró-memória”, uma variação da “pós-memória”. Se a “pós-memória” descreve uma relação com o passado que, mesmo se não experienciada diretamente, é reformulada enquanto memória, a “pró-memória” procurará dar conta da reformulação que a projeção (de si, do espaço, ou do presente) - processo que o cinema e a imagem em movimento concretizam de modo definitivo - opera sobre a constituição da memória. A ideia de uma “sobre-memória”, um acrescento ou uma memória constituída enquanto excesso, poderá também ser útil para pensar e debater este movimento de “projetar a memória” (nos outros, no espaço, e no presente). Trata-se aqui de perceber em que medida o trabalho com as memórias de outros interfere com a constituição ou definição do próprio processo de memória.

Esta questão cruza-se nas investigações em curso de ambas as editoras, aqui apontadas como exemplos do que denominamos por “pró-memória”. Sapeta Dias (2021) tem conduzido a sua investigação a partir do projeto TRAÇA que entre 2015 e 2020, convidou artistas a trabalhar a partir de arquivos de imagens desconhecidas com os quais não tinham qualquer relação ou afinidade de partida. Nos filmes amadores tratados por Laranjeiro (2023) imigrantes e filhos de imigrantes encenam-se e projetam os lugares do país de origem nas paisagens dos subúrbios das cidades portuguesas onde vivem. Partindo destas duas abordagens exemplificativas, procuraremos agregar outras, na procura de novas conceptualizações, que o campo da memória se tornou insuficiente para pensar. Desde logo, investigações recentes que procuram cruzar o banzo com a pós-memória, ou que, através de metodologias experimentais, procuram ativar memórias sensoriais de um território a que uma segunda geração (da guerra, da emigração, entre outros) não pode ter, ou ainda práticas artísticas que têm pensado o xamanismo como ativador do arquivo, serão importantes para o mapa que queremos construir nesta edição da RCL.

Este número propõe então mapear, agregar, debater e consolidar um conjunto de práticas díspares num campo específico e novo, particularmente apto a averiguar as relações que a memória estabelece com a imaginação. Para tal, procuramos contributos vindos de distintas áreas de trabalho, como os media digitais, o cinema, a performance, a fotografia, mas também os estudos de género, pós-coloniais ou mesmo a ecologia, uma vez que trabalhar neste novo campo exige averiguar a mudança em curso da perspetiva, i.e., literalmente, a mudança do centro a partir do qual se olham as imagens do passado.

Convidamos investigadores e artistas a submeterem artigos ou ensaios visuais que contribuam para o mapeamento do campo de uma pró-memória, isto é, o campo de intersecção entre memória e imaginação, onde se movem aqueles que criam a partir de imagens do passado com as quais não têm qualquer relação.

 

[NOVA DATA]
Prazo de submissão de Manuscritos completos:15 de julho de 2024
Processo de revisão: setembro a outubro de 2024 
Decisão dos editores: outubro de 2024 
Data prevista de publicação: novembro de 2024

Os artigos podem ser escritos em inglês, francês, espanhol ou português e serão revistos por blind review. Ensaios visuais também serão aceites. A formatação deve estar de acordo com as normas de submissão da revista, e a submissão deve ser feita via plataforma OJS.

Orientações para submissão e instruções para autores: https://rcl.fcsh.unl.pt/index.php/rcl/about/submissions